RECURSO – Documento:6951432 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5001802-94.2024.8.24.0055/SC RELATORA: Desembargadora Substituta QUITERIA TAMANINI VIEIRA RELATÓRIO Na origem, perante o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Rio Negrinho, o pleito formulado na Ação de Cobrança com Indenização por Danos Morais proposta por E. T. M. em face de STAR PROTECAO VEICULAR foi julgado improcedente pelos fundamentos declinados na sentença apelada (evento 37, SENT1), em cujo dispositivo constou o seguinte: Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES, com resolução de mérito (CPC, art. 487, I), os pedidos formulados por E. T. M. em face de STAR PROTECAO VEICULAR.
(TJSC; Processo nº 5001802-94.2024.8.24.0055; Recurso: recurso; Relator: Desembargadora Substituta QUITERIA TAMANINI VIEIRA; Órgão julgador: Turma, j. 15.8.2013).; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6951432 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5001802-94.2024.8.24.0055/SC
RELATORA: Desembargadora Substituta QUITERIA TAMANINI VIEIRA
RELATÓRIO
Na origem, perante o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Rio Negrinho, o pleito formulado na Ação de Cobrança com Indenização por Danos Morais proposta por E. T. M. em face de STAR PROTECAO VEICULAR foi julgado improcedente pelos fundamentos declinados na sentença apelada (evento 37, SENT1), em cujo dispositivo constou o seguinte:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES, com resolução de mérito (CPC, art. 487, I), os pedidos formulados por E. T. M. em face de STAR PROTECAO VEICULAR.
Diante da sucumbência, CONDENO a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que FIXO em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil, considerando a natureza da causa, a desnecessidade de instrução, o local de prestação de serviços e o trabalho efetivamente realizado, cuja exigibilidade fica suspensa pelo prazo de 5 anos, nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, pois concedida a gratuidade da justiça à parte autora.
CONDENO a parte autora ao pagamento de multa à parte ré, por litigância de má-fé, correspondente a 5% do valor corrigido da causa, verba esta que não se suspende pela gratuidade da justiça (art. 98, § 4º, CPC).
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Transitada em julgado, não havendo pendências, arquivem-se.
Irresignado, o autor interpôs recurso de apelação (evento 42, APELAÇÃO1). Sustentou que a decisão que julgou improcedente o pleito formulado na ação de revisão de contrato merece modificação, pois não houve notificação prévia para o cancelamento do seguro, o que viola o princípio da boa-fé objetiva. Alegou que, apesar do atraso no pagamento, as parcelas foram quitadas com juros e multa, não havendo justificativa para a negativa de cobertura após o sinistro. Sustentou que a suspensão do contrato depende de prévia interpelação, conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial, e que a ausência de notificação torna indevida a resolução contratual. Além disso, impugnou a condenação por litigância de má-fé e requereu a condenação da apelada ao pagamento do prêmio contratado, indenização por danos materiais (R$ 50.122,00) e danos morais (não inferiores a R$ 10.000,00), além da readequação dos honorários e custas.
Ao final, pediu a reforma da sentença recorrida.
O apelado apresentou contrarrazões, nas quais pugnou pela manutenção da sentença proferida na origem (evento 46, CONTRAZAP1).
Desnecessário o envio à Procuradoria-Geral de Justiça.
É o breve relato.
VOTO
Admissibilidade
No exercício da admissibilidade, preenchidos os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.
Mérito
Trata-se de apelação interposta pelo autor contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação de cobrança c/c indenização por danos morais, sob o fundamento de que o sinistro automobilístico ocorreu durante período de inadimplência, no qual os benefícios estavam automaticamente suspensos por força de cláusulas contratuais claras e destacadas, condicionando-se a reativação à realização de nova vistoria.
A sentença reconheceu, ainda, a litigância de má-fé da parte autora, ante a divergência entre a narrativa sobre “débito automático” e a documentação (boleto), com condenação à multa respectiva.
Em suas razões, o apelante sustenta, em síntese: (i) nulidade da negativa de cobertura por ausência de notificação prévia para suspensão/cancelamento; (ii) pagamento posterior com juros e multa, que afastaria a perda da cobertura; (iii) violação ao princípio da boa-fé objetiva; e (iv) afastamento da multa do art. 80 do CPC, por tratar-se, segundo afirma, de mero erro material.
No mérito, o recurso merece parcial provimento.
No presente caso, cumpre destacar que o juízo de origem reconheceu a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, todavia julgou improcedentes os pedidos iniciais, por entender que a parte ré demonstrou a inexistência de defeito na prestação do serviço, bem como a ocorrência de culpa exclusiva do consumidor, nos termos do art. 14, § 3º, do referido diploma legal.
Pois bem.
A tese recursal parte da premissa de que houve um “cancelamento” do contrato, e que, por isso, seria necessário que a parte ré tivesse feito uma interpelação prévia, ou seja, uma notificação formal antes de suspender ou cancelar os benefícios.
Tem-se como incontroverso nos autos, porque não impugnados pelas partes (art. 374, III, do CPC) que: (a) a parte autora aderiu ao programa de proteção veicular da parte ré em 13/03/2024; (b) ocorreu acidente envolvendo o veículo em 17/05/2024; e (c) a indenização não foi paga sob a alegação de que a inadimplência do associado gerou a suspensão da cobertura, condicionando-se a reativação à realização de vistoria, conforme previsto no regulamento interno.
No caso em exame, observa-se que o apelante esteve envolvido em acidente de trânsito em 17/05/2024, tendo efetuado o pagamento da mensalidade apenas em 21/05/2024 (evento 1, COMP8), ou seja, posteriormente à ocorrência do sinistro.
De acordo com o Regimento Interno da apelada, verifica-se previsão expressa de que o não pagamento das mensalidades no prazo estipulado acarreta a perda da cobertura, a qual somente poderá ser restabelecida mediante a regularização das pendências e a realização de vistoria, não sendo devida indenização ao associado que se encontre inadimplente na data do evento. Vejamos:
Cumpre salientar que, embora a apelada não se enquadre tecnicamente como seguradora, a jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que as diretrizes aplicáveis às empresas do ramo securitário devem, igualmente, ser observadas na solução de controvérsias semelhantes à presente.
Colhe-se:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA DE PROTEÇÃO VEICULAR. ACIDENTE DE TRÂNSITO. NEGATIVA DE COBERTURA NA VIA ADMINISTRATIVA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES.
APELO DA ASSOCIAÇÃO RÉ. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE ATIVA POR AUSÊNCIA DE QUALIDADE DE ASSOCIADO, À ÉPOCA DO INFORTÚNIO. PROEMIAL QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO. ANÁLISE CONJUNTA.
MÉRITO. MUTUALISMO ASSOCIATIVISTA. NATUREZA JURÍDICA DIVERSA DAS SEGURADORAS. PRETENSO AFASTAMENTO DAS NORMAS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS DE SEGURO. INSUBSISTÊNCIA. ASSOCIAÇÃO QUE, EMBORA NÃO SE ENQUADRE COMO SEGURADORA, ATRAI AS ORIENTAÇÕES VIGENTES ÀS GARANTIAS SECURITÁRIAS NAS RESOLUÇÕES DAS CONTENDAS QUE VERSEM SOBRE A NEGATIVA DE REEMBOLSO. PRECEDENTES.
"Não obstante o sistema mutualista vigente em suas avenças, vislumbrando-se, no caso concreto, que a associação de proprietárias de veículos atua como se seguradora fosse, impõe-se a análise da lide como ação de cobrança de seguro" (TJSC, Apelação Cível n. 0317523-26.2016.8.24.0008, de Blumenau, Rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 15-10-2019).
ALEGAÇÃO DE QUE A AUTORA NÃO POSSUÍA MAIS CONDIÇÃO DE ASSOCIADA QUANDO DA OCORRÊNCIA DO INFORTÚNIO, VISTO QUE ESTAVA INADIMPLENTE NO MÊS DO SINISTRO. NÃO ACOLHIMENTO. PROVAS DOCUMENTAIS QUE COMPROVAM A EXISTÊNCIA DE TRATATIVAS ENTRE AS PARTES ACERCA DE AJUSTES NA MENSALIDADE. SITUAÇÃO QUE ENSEJOU O ATRASO NO PAGAMENTO. DEMORA NO ENVIO DO BOLETO COM VALOR ATUALIZADO. MANUTENÇÃO DOS EFEITOS DO CONTRATO NO PERÍODO. NECESSÁRIA CONSTITUIÇÃO EM MORA DA AUTORA ANTES DA INTERRUPÇÃO DA COBERTURA. OBRIGAÇÃO DE REEMBOLSAR MANTIDA.
"Não basta o atraso no pagamento de parcela do prêmio para que se suspenda, automaticamente, a cobertura securitária, sendo necessária a prévia constituição em mora, por interpelação específica. (STJ, AgRg no AREsp 141.194/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 15.8.2013).
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. POSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA, A FIM DE EVITAR O AVILTAMENTO DA VERBA HONORÁRIA. ACOLHIMENTO.
RECURSO DA AUTORA. PRETENSA FIXAÇÃO DE DANOS MORAIS. INVIABILIDADE. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. AUSÊNCIA DE PECULIARIDADES A CONFORTAR O PEDIDO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO INVIÁVEL. VALOR ADEQUADO À COMPLEXIDADE DA DEMANDA. ART. 85, §2º DO CPC.
RECURSO DA RÉ CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO DA AUTORA CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 0311562-88.2018.8.24.0023, do , rel. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 17-05-2022).
No mesmo sentido, a matéria em debate restou sedimentada na jurisprudência pela Súmula 616 do Superior , rel. Helio David Vieira Figueira dos Santos, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 11-04-2024 - grifou-se).
Assim, embora exista cláusula contratual prevendo a suspensão automática do contrato sem necessidade de interpelação (cláusula terceira – evento 1, CONTR5), tal disposição mostra-se ineficaz, pois a notificação constitui requisito essencial para a resolução contratual, o que não ocorreu no caso concreto. Esse dever está expressamente consagrado em Súmula do Superior , rel. Silvio Dagoberto Orsatto, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 18-09-2025).
Deverão ser observados ainda os termos dos art. 389, caput e p. único, 395, 404 e 406, do Código Civil, com a redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024, ou seja, a correção monetária se dará pelo INPC até 29/8/2024, e a partir de 30/8/2024, pelo IPCA, ao passo que os juros de mora calculados à taxa de 1% ao mês até 29/8/2024, e a partir de 30/8/2024, com base na taxa legal, que corresponde à taxa referencial Selic, deduzido o IPCA (art. 389, parágrafo único e art. 406, § 1º, do CC).
Nesse sentido, "diante da nova redação dada aos arts. 389 e 406 do CC pela Lei n. 14.905/2024, bem como em virtude da Circular n. 345 de 2024 da CGJ/SC, até o dia 29/08/2024 deve incidir correção monetária pelo INPC a partir da data do arbitramento (Súmula nº 362, do STJ), acrescido de juros de mora 1% ao mês a partir da citação (Súmula nº 54, do STJ). A partir do dia 30/08/2024 em diante (início da vigência da Lei n. 14.905/2024), deve-se utilizar o seguinte índice: a) IPCA quando incidir apenas a correção monetária; b) a Taxa Selic deduzida do IPCA, quando incidir apenas juros de mora; c) a Taxa Selic, quando incidir conjuntamente correção monetária e juros de mora". (TJSC, Apelação n. 5015350-07.2022.8.24.0008, do , rel. Eliza Maria Strapazzon, Primeira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 14-05-2025).
Por fim, estabelece a referida Circular n. 345/2024 da Corregedoria Geral de Justiça de SC que, "na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo".
Assim, os índices de correção monetária e juros de mora devem ser, respectivamente, o IPCA e a SELIC, sendo esta última deduzida do primeiro.
Além disso, o valor da indenização ainda será definido em fase de liquidação de sentença, ocasião em que o credor fiduciário deverá ser intimado para informar nos autos o montante de seu crédito. Somente após a quitação do financiamento é que poderá ser repassado ao associado/autor qualquer valor remanescente, visto que no documento do veículo possui anotação de alienação fiduciária (evento 1, DOC4, p. 2).
Por sua vez, o pleito de indenização por danos morais não deve ser acolhido, uma vez que, conforme entendimento consolidado deste , rel. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 30-09-2025).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
RECURSO DO AUTOR
PLEITO DE APLICABILIDADE DO CDC. INSUBSISTÊNCIA. ASSOCIAÇÃO DE BENEFÍCIOS, SEM FINS LUCRATIVOS, DE PROPRIETÁRIOS DE VEÍCULOS. REQUERIDA QUE NÃO SE ENQUADRA NO CONCEITO DE FORNECEDORA DE SERVIÇOS. PRECEDENTES DA CORTE.
PROTEÇÃO VEICULAR. NEGATIVA DE PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO. INADIMPLEMENTO DO ASSOCIADO. SUSPENSÃO AUTOMÁTICA DOS SEUS DIREITOS. INVIABILIDADE. NECESSSÁRIA PRÉVIA CONSTITUIÇÃO EM MORA. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO ASSOCIADO. COBERTURA DEVIDA.
INDENIZAÇÃO. VALOR DA TABELA FIPE NO MÊS DO SINISTRO. NECESSIDADE DE DESCONTO DAS MULTAS, IPVA E DO MONTANTE EM ABERTO RELATIVO AO FINANCIAMENTO BANCÁRIO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. QUANTUM DEVIDO A SER APURADO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA, COM INTIMAÇÃO DO CREDOR FIDUCIÁRIO. DANOS EMERGENTES INDEVIDOS. EXPRESSA EXCLUSÃO DE PAGAMENTO NO REGIMENTO INTERNO DA ASSOCIAÇÃO. CONHECIMENTO DO DEMANDANTE.
DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL, QUE, POR SI SÓ, NÃO ENSEJA ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL. ADEMAIS, PREVISÃO REGIMENTAL DE EXCLUSÃO DE COBERTURA.
ÔNUS SUCUMBENCIAIS. REDISTRIBUIÇÃO NECESSÁRIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SUSPENSÃO, PORÉM, DA EXIGIBILIDADE DA VERBA EM RELAÇÃO AO DEMANDANTE POR SER BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA (ART. 98, § 3º, DO CPC).
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5002791-33.2021.8.24.0079, do , rel. Cláudia Lambert de Faria, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 25-04-2023).
Observa-se também que, na fundamentação do pedido analisado, o autor alegou que, com base nos fatos narrados e nas provas juntadas ao processo, teria direito à indenização por danos morais, afirmando ter sofrido lesão física e estar em tratamento até o presente momento. No entanto, tal causa de pedir não guarda correlação com a matéria discutida, restrita aos contornos contratuais respectivos, sendo que, além disso, não apresentou qualquer prova que comprovasse sua alegação.
Desse modo, a sentença deve ser mantida no ponto.
Litigância de má-fé
O Magistrado de origem condenou o autor ao pagamento da multa por litigância de má-fé com fulcro no artigo 80, II, do CPC, nos seguintes termos:
4. Por último, no presente caso, verifica-se que a parte autora tentou induzir em erro este Juízo ao alterar a verdade dos fatos, pois na inicial afirmou que as parcelas "seriam debitadas automaticamente de sua conta bancária". E que "a negativa da cobertura do seguro tomou por surpreso o autor, que imaginava que as parcelas do seguro haviam sido descontadas". Todavia, o boleto de e. 1.6 nada menciona sobre a habilitação do débito automático. Ainda, menciona, claramente, que o pagamento não deveria ser aceito após o dia 15.
Ou seja, a parte autora manifestamente faltou com a verdade ao expor os fatos na inicial, não cumprindo com os deveres de lealdade e boa-fé processuais que se esperam de todos os sujeitos que atuam no processo.
Diante do exposto, tendo em vista que a parte autora alterou a verdade dos fatos, deve ser condenada à multa por litigância de má-fé, nos termos do art. 80, II, do Código de Processo Civil.
Considerando o acima exposto, com respaldo no art. 81 do CPC, arbitro a multa em 5% sobre o valor corrigido da causa.
Em vista disso, o apelante impugnou a condenação em questão, alegando que o erro na petição inicial foi material e não teve o intuito de induzir o juízo a erro, tendo inclusive juntado comprovante de pagamento no evento 1, COMP8.
Entendo que razão lhe assiste.
Isso porque, independentemente da narrativa apresentada pelo autor na petição inicial e do posterior pagamento em atraso, o provimento parcial do recurso — para condenar a ré ao pagamento da indenização a título de “proteção veicular” — foi fundamentado na aplicação da Súmula 616 do STJ. Essa súmula estabelece que a indenização securitária é devida quando não há comunicação prévia ao segurado sobre o atraso no pagamento do prêmio, por se tratar de requisito essencial para a suspensão ou resolução do contrato de seguro.
Ou seja, de forma incontroversa nos autos, a seguradora ré não realizou a comunicação prévia ao segurado acerca do atraso no pagamento do prêmio e, por esse motivo, mostrou-se indevida a negativa de indenização fundamentada exclusivamente no atraso da mensalidade.
Além disso, "para que haja condenação em multa por litigância de má-fé é necessário que esteja evidenciado o dolo do litigante em prejudicar a parte contrária ou o de atentar contra o regular desenvolvimento do processo", (TJSC, Apelação n. 5001361-08.2020.8.24.0103, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. em 18/10/2022), o que não é o caso dos autos.
Ademais, no entendimento de Pontes de Miranda:
Presume-se de boa-fé quem vai litigar, ou está litigando, ou litigou. Tal presunção somente pode ser elidida in casu e quando haja má-fé, propriamente dita; a apreciação do exercício abusivo do direito tem que partir daí (Comentários ao código de processo civil, Forense, 1973, tomo I, p. 385).
No caso, não restaram demonstrados os requisitos legais necessários à condenação da apelante ao pagamento de multa por litigância de má-fé, razão pela qual o recurso merece provimento para afastar a penalidade imposta na origem.
Da sucumbência
Diante do provimento parcial do recurso, alterando assim o acolhimento da pretensão expendida pelo autor da ação originária, é necessário redistribuir os ônus sucumbenciais fixados na origem. Assim, havendo sucumbência recíproca, arcará a autora com 40%, e a instituição ré com 60% das despesas processuais.
Os honorários advocatícios ficam estabelecidos em 10% sobre o valor da condenação ao advogado do requerente e em 10% do proveito econômico obtido aos advogados da da requerida, consistente no valor da pretensão a título de danos morais que restou inacolhida.
Por fim, fica ressalvada a suspensão da exigibilidade para o autor, por ser beneficiário da gratuidade (art. 98, §§ 2º e 3º do CPC).
Dos honorários recursais
Considerando o parcial provimento do recurso do autor, incabível a fixação de honorários recursais, a teor do §11 do art. 85 do CPC.
No caso, segundo a orientação da Corte Especial do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5001802-94.2024.8.24.0055/SC
RELATORA: Desembargadora Substituta QUITERIA TAMANINI VIEIRA
EMENTA
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE COBRANÇA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. APELAÇÃO CÍVEL. PROTEÇÃO VEICULAR. INADIMPLÊNCIA DO ASSOCIADO. CLÁUSULA DE SUSPENSÃO AUTOMÁTICA. NECESSIDADE DE PRÉVIA INTERPELAÇÃO. SÚMULA 616/STJ. NEGATIVA DE COBERTURA INDEVIDA. INDENIZAÇÃO CONTRATUAL DEVIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA DESDE A CONTRATAÇÃO (SÚMULA 632/STJ). JUROS E CORREÇÃO À LUZ DOS ARTS. 389 E 406 DO CC, COM REDAÇÃO DA LEI 14.905/2024 (IPCA E TAXA SELIC, CONFORME ORIENTAÇÃO LOCAL). DANO MORAL INOCORRENTE. PENALIDADE EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ IMPOSTA NA ORIGEM AFASTADA. PARCIAL PROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME: Recurso de apelação interposto em ação de cobrança c/c indenização por danos morais, na qual se debate negativa de cobertura de programa de proteção veicular por suposta inadimplência, diante de sinistro automobilístico ocorrido após o vencimento da mensalidade, paga somente dias depois. Sentença de improcedência quanto à cobertura e reconhecimento de litigância de má-fé, com condenações acessórias. A parte apelante sustenta necessidade de notificação prévia para suspensão/cancelamento, pagamento posterior com encargos, violação da boa-fé objetiva e afastamento de multa por má-fé.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: As questões em discussão consistem em: (i) verificar se a suspensão/resolução da cobertura por inadimplência depende de interpelação específica e prévia do associado; (ii) definir a validade de cláusula contratual que prevê suspensão automática sem notificação; (iii) estabelecer o termo inicial e os critérios de atualização e juros da indenização contratual (Súmulas 616 e 632 do STJ e arts. 389 e 406 do CC, redação da Lei 14.905/2024); (iv) avaliar a configuração de dano moral por negativa de cobertura; (v) disciplinar a apuração do quantum em liquidação com intimação do credor fiduciário; e (vi) analisar a existência de dolo apto a justificar a condenação da parte apelante por litigância de má-fé.
III. RAZÕES DE DECIDIR: (vii) A suspensão/resolução da cobertura por inadimplência exige prévia constituição em mora do associado por interpelação específica; cláusula contratual de suspensão automática, sem comunicação, é ineficaz à luz da Súmula 616 do STJ e do ônus probatório do art. 373, II, do CPC, não comprovada a notificação no caso concreto. (viii) Embora o sinistro tenha ocorrido quando havia atraso no pagamento, o adimplemento posterior não afasta, por si, o dever de indenizar se ausente a notificação prévia, impondo-se o reconhecimento do direito à indenização na forma contratada (proteção veicular). (ix) A indenização contratual deve observar a previsão de pagamento conforme o valor de referência do bem pactuado, com definição do montante em liquidação, assegurada a intimação do credor fiduciário para informar seu crédito e repasse ao associado apenas do eventual saldo remanescente após a quitação. (x) A correção monetária incide desde a contratação (Súmula 632 do STJ), e os juros/correção observam os arts. 389 e 406 do Código Civil, com a redação da Lei 14.905/2024, adotando-se IPCA para atualização e taxa Selic na conformidade das diretrizes locais mencionadas. (xi) O mero inadimplemento contratual não configura, por si, dano moral, ausentes circunstâncias excepcionais que justificassem algum abalo à esfera íntima da pessoa (art. 373, I, do CPC). (xii) Não restou demonstrado o dolo necessário à configuração da litigância de má-fé, sendo insuficiente a alegação de erro material na petição inicial para justificar a penalidade imposta.
IV. DISPOSITIVO: Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada em parte para condenar a parte ré ao pagamento da indenização contratual a título de proteção veicular, nos termos do ajuste, com atualização e juros conforme fundamentação, a serem apurados em liquidação, com intimação do credor fiduciário para fins de abatimento e repasse de eventual saldo remanescente ao associado, e afastar a penalidade por litigância de má-fé imposta na origem. Mantida a improcedência do pedido de danos morais. Redistribuição dos ônus sucumbenciais, com suspensão da exigibilidade em favor da parte apelante beneficiária da gratuidade. Honorários recursais incabíveis.
Teses de julgamento:
“1. A suspensão ou resolução da cobertura por inadimplência, em contratos de proteção veicular que se assemelham ao seguro, exige interpelação específica e prévia do associado; cláusula de suspensão automática sem notificação é ineficaz (Súmula 616/STJ).”
“2. Nas indenizações decorrentes de proteção veicular/seguro, a correção monetária incide desde a contratação (Súmula 632/STJ), e os juros/correção observam os arts. 389 e 406 do CC com a redação da Lei 14.905/2024, segundo as diretrizes locais aplicáveis.”
“3. O mero inadimplemento contratual, desacompanhado de circunstância excepcional, não enseja dano moral indenizável.”
“4. A condenação por litigância de má-fé exige demonstração inequívoca de dolo, não sendo suficiente a existência de erro material na petição inicial.”.
Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 373, I e II; CPC, art. 374, III; CPC, art. 487, I; CDC, art. 14, § 3º; CC, arts. 389 (caput e parágrafo único), 395, 404 e 406 (Lei 14.905/2024); Súmulas 616 e 632 do STJ; orientação local sobre IPCA e taxa Selic (Circular n. 345/2024 da CGJ/SC).
Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 141.194/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 15.08.2013; STJ, REsp 1.673.368/MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 15.08.2017; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 2.183.167/MG, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 27.11.2023; TJSC, Apelação n. 0311562-88.2018.8.24.0023, Rel. Ricardo Fontes, j. 17.05.2022; TJSC, Apelação n. 0317523-26.2016.8.24.0008, Rel. Luiz Cézar Medeiros, j. 15.10.2019; TJSC, ApCiv 5001464-35.2020.8.24.0064, Rel. p/ Acórdão Rubens Schulz, j. 30.09.2021; TJSC, Apelação/Remessa Necessária n. 0301226-62.2014.8.24.0056, Rel. Hélio David Vieira Figueira dos Santos, j. 11.04.2024; TJSC, Apelação n. 5001741-59.2021.8.24.0050, Rel. Sílvio Dagoberto Orsatto, j. 18.09.2025.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para: (i) condenar a ré ao pagamento da indenização a título de "proteção veicular", na forma contratada, o qual deverá ser atualizado até o efetivo pagamento; e (ii) afastar a penalidade em litigância de má-fé imposta na origem. Com isso, ficam redistribuídos os honorários sucumbencias. Inviável a fixação de honorários recursais, na forma da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por QUITERIA TAMANINI VIEIRA, Desembargadora Substituta, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6951433v7 e do código CRC acc26084.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 12/11/2025 A 19/11/2025
Apelação Nº 5001802-94.2024.8.24.0055/SC
RELATORA: Desembargadora Substituta QUITERIA TAMANINI VIEIRA
PRESIDENTE: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Certifico que este processo foi incluído como item 97 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 12/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 22:20.
Certifico que a 1ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E, NO MÉRITO, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA: (I) CONDENAR A RÉ AO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE "PROTEÇÃO VEICULAR", NA FORMA CONTRATADA, O QUAL DEVERÁ SER ATUALIZADO ATÉ O EFETIVO PAGAMENTO; E (II) AFASTAR A PENALIDADE EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ IMPOSTA NA ORIGEM. COM ISSO, FICAM REDISTRIBUÍDOS OS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAS. INVIÁVEL A FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS, NA FORMA DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Substituta QUITERIA TAMANINI VIEIRA
Votante: Desembargadora Substituta QUITERIA TAMANINI VIEIRA
Votante: Desembargador Substituto MARCO AURELIO GHISI MACHADO
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
ALESSANDRA MIOZZO SOARES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:43:32.
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